Educação Condutiva no Brasil
Em setembro estará sendo publicado na Inglaterra um Livro sobre experiências de famílias com a educação condutiva, em diversos países do mundo. No mesmo modelo do livro Just do it, onde a condutora Becky Featherstone contou a sua experiência como condutora em nosso projeto em Florianópolis. Desta vez eu estarei escrevendo a nossa história, como começamos e até onde chegamos. Publico aqui em primeira mão o artigo, escrito por mim, que será em breve editado por Gillian Maguire e Andrew Sutton.
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Educação Condutiva Com Amor: um case no Brasil.
Leticia Búrigo Tomelin Kuerten, leticia.kuerten@gmail.com
Era no ano de 2004 quando passou na televisão brasileira uma matéria sobre um método voltado a crianças com dificuldades motoras chamado Educação Condutiva. Foi meu primeiro contato com o sistema húngaro que viria a mudar minha forma de enxergar as possibilidades da vida junto aos meus filhos, gêmeos com paralisia cerebral.
A matéria contava a história de uma mãe que buscava maior independência para sua filha. Ela desejava recursos para ir a Hungria e experimentar este método oportunizando a ela uma vida mais ativa.
De imediato achei que este método chamado Educação Condutiva não era desenhado para os meus filhos, já que eu os via muito pobres de movimentos para executar as tarefas ali sugeridas. Imaginava que a Educação Condutiva era para crianças em melhor estado de desenvolvimento do que as minhas.
De todas as formas a curiosidade me fez pesquisar mais sobre o método. Confesso que li e reli as informações em inglês e por mais que eu lia não conseguia entender o funcionamento daquelas rotinas. Tentei conversar com profissionais da área da saúde, como médicos ou fisioterapeutas, sobre o método húngaro, no entanto ninguém conhecia, ou tinha ouvido falar.
Ao me informar um pouco mais, entendi que tratava-se de algo muito diferente do que já tínhamos experimentado. Tratava-se de um sistema de educação que funcionava em grupo e realizava movimentos repetitivos para as situações diárias, percebendo o indivíduo como um ser completo.
Seguindo as coincidências que a vida nos oferece, encontrei casualmente com uma professora de escola infantil dizendo que estava indo ao México para um curso de férias com a intenção de conhecer a Educação Condutiva. Percebi que conhecer o método estava mais próximo do que eu imaginava.
Durante a gravidez dos meninos eu estive a partir da 12a. semana em repouso absoluto. Passei parte do tempo hospitalizada e na maioria das vezes inconsciente dos riscos de uma gravidez gemelar no quadro infeccioso que eu me encontrava. Em junho de 2002, meus filhos nasceram com 28 semanas de gestação e do hospital saíram com um novo sobrenome: paralisia cerebral. A partir daquele momento minha dedicação era somente para meus filhos, com curiosidade e estudo para descobrir as diversas formas de estímulos que viessem a estimular a plasticidade neuronal no cérebro.
Decidimos embarcar com toda a família para o México em busca deste algo mais, desta oportunidade singular. Era agosto de 2005.
Neste período no Brasil, nós fazíamos fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, musicoterapia, hidroterapia, equoterapia, além de terapias alternativas.
Também foi nesta época que minha filha, nascida 2 anos após os gêmeos, aprendeu a engatinhar e começou a derrubar todos os dvds e as fitas vhs que decoravam nossa sala de estar. Um de meus filhos me disse com entusiasmo:
- Mãe, eu também quero derrubar isso tudo!
E eu, somente neste momento, percebi que eles, apesar de seguirem uma rotina diária e diversificada de atividades, não tinham noção de como realizar suas ações de forma independente. Eles eram muito bem alongados fisicamente mas não tinha sido despertado neles a intenção do movimento a partir do cérebro.
Nossa experiência no México foi intensa. Pela primeira vez vi meus filhos com seus 3 anos de vida, serem respeitados em relação as suas vontades motoras, serem questionados sobre seus objetivos e seus interesses. Foi a primeira vez que os vi atentos aos objetivos conscientes de seus movimentos.
Foram quatro semanas de muito trabalho para as crianças e paralelamente eu e meu marido pudemos assistir alguns vídeos sobre o Instituto Peto, sobre a biografia de Andras Peto, e conhecendo declarações de alguns de seus ex-alunos e ex-condutores. Foi o suficiente para que estas sensações despertassem em mim mais curiosidade para conhecer o método com profundidade.
Naquele momento me interessei profundamente pela Educação Condutiva e pela forma de respeito e igualdade que meus filhos eram conduzidos. Com maturidade e responsabilidade, mesmo tendo 3 anos de idade.
Minha reação imediata após o curso no México foi convidar meu marido para tomarmos uma decisão em conjunto em busca de uma nova experiência em algum outro país que oferecesse a Educação Condutiva. Decidimos por investir um ano de nossas vidas para dedicação de nossos filhos com o método húngaro na Inglaterra.
Seguindo mais uma vez o sincronismo da vida , fomos a Birmingham, onde eu mesma já havia me hospedado na casa de uma amiga brasileira, em frente ao Cannon Hill Park, parque que fica em frente ao National Institute of Conductive Education, muitos anos antes de ser mãe.
Em janeiro de 2006 estávamos chegando na Inglaterra experimentando uma nova rotina, nova cultura e um novo método de aprendizagem para crianças com paralisia cerebral.
Durante este ano em que vivemos na Inglaterra, passei parte de meus momentos na biblioteca devorando livros e artigos, tentando saturar a minha curiosidade sobre a história, os objetivos, os desenvolvimentos, e as possibilidades que o método nos oferecia.
Vivi o ambiente da escola, assistindo adultos e crianças fazendo atividades externas, participando de passeios em família, assistindo a palestras e bebendo toda a experiência com a educação condutiva.
Repito muitas vezes esta dúvida para comigo mesmo. Eu não sei se a educação condutiva fez mais bem para mim, ou para meus filhos. A medicina e a fisioterapia sempre me ensinaram a ver a limitação, aquilo que os meus filhos não podiam fazer. A educação condutiva me ensinou a enxergar o outro lado, o potencial que eles ainda tem em aprender.
Eu passei a comemorar cada pequeno passo, cada vitória e viver intensamente cada momento do agora. Passei a respeitar a individualidade deles, sendo eles assim como são. A importância de dar a eles disciplina, com regras claras, ensinando a percepção corporal, a consciência de seu corpo, sempre com motivação e alegria com a comemoração de cada conquista.
A educação condutiva é uma união de movimentos simples e repetitivos que oferecem a informação correta, uma série de pequenas tarefas que formam um grande movimento. As informações que são repetidas e motivadas pelas ordens da condutora:
- Com os meus pés apoiados no chão, eu estico meus joelhos e posiciono o meu corpo no meio, coloco minhas mãos sobre a mesa e mantenho meu corpo reto. Eu estou de pé. Mantenho, mantenho, mantenho.
Ter a consciência de cada movimento, construindo cada pequena tarefa para buscar uma ação ativa, com a mente sempre consciente dos movimentos do corpo. A Educação Condutiva é uma atividade intensa e cansativa, tanto física quanto mental.
A educação condutiva é um sistema de educação que vê um indivíduo como um todo, de forma holística, estimulando atividades motoras, sociais, emocionais e cognitivas. As crianças vivenciam rotinas diárias, com programas curtos variando de acordo com a idade e o desenvolvimento da criança.
Lembro quando meus filhos foram pela primeira vez para a escola regular e a professora me pediu orientação da fisioterapeuta para melhor incluir as crianças. A fisioterapeuta orientou a professora em relação a postura das crianças na posição sentado e nas atividades de educação física, mas quando a professora questionou sobre o momento do lanche, a fisioterapeuta indicou que a fonoaudióloga fosse solicitada. O mesmo aconteceu quando a professora questionou sobre as atividades de desenho, escrita e manipulação na mesa de trabalho, ela solicitou que a terapeuta ocupacional fosse solicitada.
As terapias tradicionais enxergam os meus filhos por pequenas partes, focando apenas em algum movimento, membro ou determinada musculatura. A Educação Condutiva vê meu filho como um ser completo, por inteiro; seja no reflexo de uma motivação na postura em pé, na atividade em grupo, a resposta do comportamento adequado, o esperar a vez, entre outras relações.
Fico feliz somente de repetir este ensinamento, pois a educação condutiva é muito rica como filosofia em nos ensinar estas relações completas, de nossas ações, de nossos anseios e de nossas conquistas.
Quem de nós termina uma tarefa pensando em fazer melhor da próxima vez? A cada seqüência de tarefas nas rotinas da educação condutiva as crianças recebem um objetivo, e após realizadas analisam seu desempenho e se programam para uma resposta mais precisa e positiva na próxima vez.
Ao retornar da Inglaterra decidimos iniciar um projeto formando um grupo que atendesse aos meus filhos e também outras crianças que pudessem experimentar a educação condutiva em nosso País. Era um sonho, o projeto Com Amor.
Começamos com uma condutora, meus dois filhos e muita vontade em querer fazer. Em fevereiro de 2007 formamos uma parceria com uma escola de ensino regular e passamos a utilizar o espaço deles, a sala de aula em período contrário ao horário escolar para exercer as atividades de educação condutiva. O ambiente escolar é muito rico em estímulos e foi muito prazeroso o momento que vivenciamos.
Precisávamos dos móveis e não encontramos dificuldades ao elabora-los em nossa região. Seguindo fotos e medidas orientadas pela condutora, construímos artesanalmente as mesas, cadeiras e barras necessárias. Acessórios como espelhos, barras de fixação na mesa e banquetas também foram feitas. Da Hungria vieram as argolas de diversos tamanhos e as barras de pressão em borracha.
Em 3 meses, nosso período de adaptação estava em ótimas condições, tínhamos uma profissional de educação física trabalhando em conjunto com a condutora auxiliando na construção das rotinas e com o idioma; ambas não mediram esforços para que o projeto fosse estabelecido. Ao final deste breve período conseguimos traduzir, escolhendo as melhores palavras de acordo com o regionalismo nacional, os programas elaborados pela condutora para o português.
Com a divulgação boca a boca, conseguimos que uma família viesse conhecer a educação condutiva como método, o que imediatamente fez a criança participar do grupo. Tínhamos um grupo pré-escolar, meus filhos estavam com 5 anos.
Ainda durante este ano elaboramos músicas seguindo ritmos brasileiros, com ordens condutivas que fossem adequadas aos programas estipulados pela condutora. Formamos um grupo: 3 crianças, 1 condutora, 2 educadoras, móveis, músicas e muito entusiasmo. O sonho estava completo.
Através do blog (http://educacaocondutiva.blogspot.com), escrevendo mais sobre a educação condutiva e relatando nosso dia a dia, surgiram famílias de diversas partes do Brasil que despertaram o interesse em nos visitar. Devido a distância decidimos criar o Curso de Férias no mês de julho para que as famílias experimentassem as rotinas de educação condutiva. Desde então recebemos anualmente 8 crianças neste período, que durante 3 semanas vivenciam os programas da educação condutiva de forma integral.
O projeto cresceu e tivemos que nos mudar para um espaço mais amplo. Em 2008 iniciamos o ano com uma nova condutora em um novo espaço. O local era um sitio com muito estímulo da natureza, contato com animais e agradável sensação de bem estar. Também conseguimos adequar os banheiros do local de acordo com as necessidades do grupo. Neste novo espaço desenhamos móveis novos, como andadores, barras paralelas e novos jogos de mobília para atender ao grupo de crianças que fomos recebendo.
Neste ano novamente recebemos famílias para o Curso de Férias, a presença das famílias é sempre muito importante no desenvolvimento e credibilidade do projeto, uma vez que relatam uma experiência positiva e acabam divulgando o projeto Com Amor. A observação do desempenho no desenvolvimento de seus filhos também é muito gratificante. Cada família cerca um objetivo e acaba alcançando vários outros. Relatos de pais descrevem o aprendizado, a rotina e a disciplina conseguidos com a educação condutiva como fundamentais no desenvolvimento das habilidades no dia a dia de suas crianças.
Os meses que se passaram serviram para sedimentar o projeto, a equipe, as rotinas, criando uma estabilidade ainda não vivenciada pelo grupo. No entanto em relação ao desempenho das crianças, muitos objetivos foram vagarosamente alcançados, e algumas metas pareceram ficar cada vez mais distantes. Percebemos que em alguns momentos vemos a evolução rapidamente, mas em outros parecem momentos de estabilidade, sem muitos progressos. O ano seguiu repleto de visitas e novas avaliações.
O sonho que já era completo não terminava. Muitas realizações foram sendo conquistadas e decidimos montar uma sala dedicada somente a educação condutiva. Seguindo orientações da condutora, aproveitamos uma construção existente e adequamos as nossas necessidades. Incluindo copa, banheiros adaptados, passeios adequados, ausência de degraus e duas salas para atender as necessidades do grupo.
Em 2010 inauguramos o novo espaço com o nosso evento anual, chamado Open Day, dia dedicado a divulgação do método a interessados através de uma palestra e a observação das rotinas e programas. Sempre recebemos muitos profissionais, famílias e curiosos para conhecer e questionar sobre a educação condutiva.
Também recebemos novos condutores para liderar o grupo e despertamos muitas expectativas de mudança em relação a objetivos e desejos das famílias após alguns anos experimentando a educação condutiva. Pelo quarto ano recebemos novas famílias para o curso de férias com muito êxito.
Após estes anos contabilizamos mais de 30 crianças que estiveram em algum momento no projeto Com Amor, seja através da rotina diária, dos cursos de julho, dos programas visitantes ou das sessões de avaliação. A grande maioria das famílias tiveram a oportunidade de conhecer a educação condutiva pela primeira vez e pode não parecer um número muito grande, mas a grande maioria deles veio nos visitar em busca de uma nova oportunidade e de esperança para melhorar o desempenho de seus filhos.
Os objetivos continuam e para os próximos anos objetivamos construir novas rotinas e atender o dobro de crianças até hoje atendidas, remodelar os programas de acordo com a idades do grupo, criar novas músicas e acompanhar a evolução das crianças que com o passar dos anos passaram a se interessar por novos temas e ritmos.
Estamos crescendo juntos e já sabemos que nosso sonho nunca acaba. Com amor enfrentamos todos os limites do corpo e da mente para conquistar uma vida mais adequada a crianças com dificuldades especiais, agradecendo os dias que aprendemos. Uma certeza temos: com o estímulo correto, aprenderemos sempre!
Eu só tenho a agradecer ao Dr. Peto por esta união de ensinamentos reunidos neste disciplinado sistema educacional visando melhor qualidade de vida para pessoas com paralisia cerebral e outras desordens motoras. A ele e a seus seguidores: condutores, como realizadores de sonhos; e pais, como esperançosos na busca de mais aprendizagem e desempenho.
Solicito que cópias desta publicação em outros locais sejam consultados ao autor ou editor.
1 Comments:
Realmente Woww! Completamente foi um cenário difícil para mim, pessoalmente, no entanto, tomar ...aula ingles florianopolis Nossa primeira escola no Brasil, localizada em Florianópolis, oferece diversos tipos de curso, dentre eles conversação, aula particular, preparatório para os exames IELTS e Cambridge, business English etc.
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